quarta-feira, 16 de outubro de 2013

teorema da felicidade I

Há pessoas que são espíritos livres. Aquelas que não conseguem estar sempre no mesmo sítio, com as mesmas pessoas, com a mesma rotina. Eu sou assim. Não me entristece ser deixada pelos amigos. Não sou daquelas pessoas que têm um grupo de amigos desde os três anos de idade. Eu sou daquelas que sou atraída pela novidade, não me magoa ter de começar a minha vida do zero, noutra cidade, com outras pessoas. E é estranho ser assim quando sempre fui ensinada a dar valor à família. Mas existe uma explicação.
                Eu sonhava crescer com as minhas amigas da primária sempre do meu lado, sonhava poder contar-lhes tudo o que se passava na minha vida: o primeiro beijo, a primeira negativa, a primeira saída, a primeira vez, tudo. Nada aconteceu como planeado. Houve muitas desilusões pelo caminho. A minha maneira de sobreviver a tudo isso foi guardar o melhor e o pior da vida para mim. Comecei a escrever diários. Comecei a acreditar nas palavras que me diziam porque no momento eram perfeitas. Deixei de me importar quando as pessoas me deixavam. E foi assim que eu cresci.
                Nunca tinha pensado agarrar-me tanto a uma pessoa e levá-la comigo para onde quer que fosse. Até aquele momento. Até aquele preciso momento em que conheci a melhor pessoa do mundo.

                Desde os 18 anos que trabalhava. Comecei em cafés e pastelarias, apenas para conseguir ganhar algum dinheiro para comprar a minha linda carrinha, uma Pão de Forma. Não, não sou hippy nem fumo erva. Apenas queria ter a minha própria casa ambulante e viajar pelas cidades. Queria ser nómada e foi nisso que acabei por me tornar. Sempre que estava mal num sítio ou aborrecida, mudava de cidade e conseguia sempre arranjar emprego nos estabelecimentos que queria. Tanto os meus pais como todas as pessoas que me iam conhecendo ao longo do tempo achavam que eu não tinha objetivos, que era uma drogada, inculta e etc. Sim, etc., visto que os meus adjetivos eram inúmeros. Nunca me importei com isso. Todos os anos, pelo Natal, quando voltava a casa durante duas semanas, a minha mãe perguntava sempre o mesmo: “Já namoras? Já arranjaste um trabalho decente? Já te decidiste a voltar a estudar?” Não. Não. Não. Eram as respostas que eles esperavam ouvir e que eu queria dar. Não valia a pena gastar saliva a falar da minha vida. Tinha paixões, muitas delas correspondidas, mas nunca me deixava levar porque não queria ficar presa a nenhum sítio e muito menos por uma paixão que, mais tarde ou mais cedo, ia acabar. Todos os trabalhos que tinha tido eram decentes, mas não para os meus pais. Eu era feliz a trabalhar em cafés porque era simples, comunicava com as pessoas e era boa no que fazia. E em relação ao estudo, eu nunca tinha chegado a parar de estudar, mas nunca tinha andado na faculdade. Queria estudar tudo o que queria, desde como se fazer um bom bolo de chocolate até às Leis de Newton. Não queria ter horários nem queria que me obrigassem a estudar um tópico de cada vez. Queria estudar a vida em geral, desde os mais pequenos prazeres até aos teoremas mais complexos da matemática, desde culinária até geometria, desde arte até às células. Por isso é que era uma nómada, um espírito livre: não tinha horários nem lugares restritos para ser feliz. 

(continua)

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